Grito
de terror!
-
O que foi isso, mulher?
Ela
aponta para algum lugar indefinido, no chão.
-
Foi uma barata?
Ela
balançou a cabeça negativamente com os olhos esbugalhados.
-
Foi um rato?
Outra
negativa, com feições cada vez mais assustadoras.
Pensei
comigo, calma, muita calma nessa hora, já dizia o “filósofo” Zeca Pagodinho.
Decido
investigar. Não que eu seja tão corajoso assim. Mas e o meu papel de macho,
como fica? Ta certo, só estamos nós dois em casa, ninguém iria saber se eu
obedecesse meus instintos e me atirasse embaixo do cobertor. Mas sabe como é, o
sexo feminino não consegue guardar segredos valiosos.
Tenho
que me concentrar. Talvez assim minhas pernas parem de tremer. Olho de soslaio
para minha mulher. Não devia ter olhado, principalmente se aquela figura em
estado de torpor, escorada na geladeira disputando quem estaria mais branca e
mais gelada, for mesmo a minha consorte.
Chorar
não adianta, por isso desisti de fazê-lo. Avanço então, sorrateiramente, em
direção à porta. Na verdade abriguei-me sob a mesa de jantar, mas juro que ela
estava a meio caminho daquela porta. Foi apenas uma tática.
Tirando
alguns espasmos indecifráveis da minha esposa, o silêncio era mórbido. Isso
pode me dar alguma vantagem, pensei. Se tiver mais alguém dentro de casa vou
escutar ruídos. Minha primeira reação foi tapar os ouvidos, mas quando me dei
conta do ridículo da cena juntei toda a coragem que ainda me restava e tomei
uma decisão drástica: comecei a rezar fervorosamente para que tudo fosse apenas
um sonho!
Quando já estava dolorido de tanto me
beliscar, fui obrigado a aceitar a cruel realidade e lembrei-me de outro grande
“filósofo”, Ivan Lins (para alguns, um pouco mais sofisticado que o Zeca):
desesperar jamais! E realmente, eu não estava desesperado...estava alucinado!
Ou como será que poderia rotular aquele estágio em que a boca seca, a
respiração fica ofegante, a transpiração incessante, a bexiga...bem, vamos
pular essa parte para não pisar no molhado.
Tinha
que partir para o “tudo ou nada”. Aliás, tudo que queria nesse momento era não
fazer nada. E para isso não precisaria muito esforço. Mas lembrei-me de ter
ouvido que a gente não consegue nada sem ir à luta. Deve ter sido aquele idiota
do professor de Filosofia!
Mas
quem vai tomar a decisão agora sou eu! A humanidade precisa de mim neste
momento! Exagero? E se for algum ET? MEU DEUS, e se for algum ET?! Bem, ele vai
achar que todo terráqueo tem os cabelos arrepiados, os olhos arregalados,
tremem igual vara verde e adoram se instalar embaixo da mesa!
É
melhor parar de divagações e partir para a ação! Não posso ficar aqui para
sempre... a não ser que consiga água e mantimentos...
Não adianta adiar mais o momento do
meu infortúnio. Instante de tensão! Despedi-me do mundo e, lentamente, fui
deixando o meu providencial refúgio. Caminhei devagar em direção à porta. A
sensação era de um condenado a cadeira elétrica, pisando no corredor da morte.
De repente, num supremo esforço, até para não bater a cabeça na parede, abri
corajosamente os olhos. Foi então que eu vi!
“Aquilo”!
No
chão, embaixo da porta!
Foi
horripilante!
Era
bem pior do que eu imaginava!
Entendi
então o desespero da minha amada!
Só
lembro que antes de desmaiar, dominei meu asco, peguei “aquilo” nas mãos e
sussurrei num último fio de voz:
-
Maldita conta de telefone!