sexta-feira, 15 de maio de 2015

ISTO É UM ASSALTO!



            Grito de terror!
            - O que foi isso, mulher?
            Ela aponta para algum lugar indefinido, no chão.
            - Foi uma barata?
            Ela balançou a cabeça negativamente com os olhos esbugalhados.
            - Foi um rato?
            Outra negativa, com feições cada vez mais assustadoras.
            Pensei comigo, calma, muita calma nessa hora, já dizia o “filósofo” Zeca Pagodinho.
            Decido investigar. Não que eu seja tão corajoso assim. Mas e o meu papel de macho, como fica? Ta certo, só estamos nós dois em casa, ninguém iria saber se eu obedecesse meus instintos e me atirasse embaixo do cobertor. Mas sabe como é, o sexo feminino não consegue guardar segredos valiosos.
            Tenho que me concentrar. Talvez assim minhas pernas parem de tremer. Olho de soslaio para minha mulher. Não devia ter olhado, principalmente se aquela figura em estado de torpor, escorada na geladeira disputando quem estaria mais branca e mais gelada, for mesmo a minha consorte.
            Chorar não adianta, por isso desisti de fazê-lo. Avanço então, sorrateiramente, em direção à porta. Na verdade abriguei-me sob a mesa de jantar, mas juro que ela estava a meio caminho daquela porta. Foi apenas uma tática.
            Tirando alguns espasmos indecifráveis da minha esposa, o silêncio era mórbido. Isso pode me dar alguma vantagem, pensei. Se tiver mais alguém dentro de casa vou escutar ruídos. Minha primeira reação foi tapar os ouvidos, mas quando me dei conta do ridículo da cena juntei toda a coragem que ainda me restava e tomei uma decisão drástica: comecei a rezar fervorosamente para que tudo fosse apenas um sonho!
           Quando já estava dolorido de tanto me beliscar, fui obrigado a aceitar a cruel realidade e lembrei-me de outro grande “filósofo”, Ivan Lins (para alguns, um pouco mais sofisticado que o Zeca): desesperar jamais! E realmente, eu não estava desesperado...estava alucinado! Ou como será que poderia rotular aquele estágio em que a boca seca, a respiração fica ofegante, a transpiração incessante, a bexiga...bem, vamos pular essa parte para não pisar no molhado.
            Tinha que partir para o “tudo ou nada”. Aliás, tudo que queria nesse momento era não fazer nada. E para isso não precisaria muito esforço. Mas lembrei-me de ter ouvido que a gente não consegue nada sem ir à luta. Deve ter sido aquele idiota do professor de Filosofia!
            Mas quem vai tomar a decisão agora sou eu! A humanidade precisa de mim neste momento! Exagero? E se for algum ET? MEU DEUS, e se for algum ET?! Bem, ele vai achar que todo terráqueo tem os cabelos arrepiados, os olhos arregalados, tremem igual vara verde e adoram se instalar embaixo da mesa!
            É melhor parar de divagações e partir para a ação! Não posso ficar aqui para sempre... a não ser que consiga água e mantimentos...
            Não adianta adiar mais o momento do meu infortúnio. Instante de tensão! Despedi-me do mundo e, lentamente, fui deixando o meu providencial refúgio. Caminhei devagar em direção à porta. A sensação era de um condenado a cadeira elétrica, pisando no corredor da morte. De repente, num supremo esforço, até para não bater a cabeça na parede, abri corajosamente os olhos. Foi então que eu vi!
            “Aquilo”!
            No chão, embaixo da porta!
            Foi horripilante!

            Era bem pior do que eu imaginava!
            Entendi então o desespero da minha amada!
           Só lembro que antes de desmaiar, dominei meu asco, peguei “aquilo” nas mãos e sussurrei num último fio de voz:
            - Maldita conta de telefone!